* Márcio Alexandre

O rapaz tem pouco mais de 20 anos. No cruzamento do centro da cidade onde estão localizadas, lado a lado, as duas maiores lojas de departamento da cidade, ele está com seu “negócio”: um pequeno tabuleiro portátil com balas e outras guloseimas.

Anuncia sua mercadoria com ênfase. Bem educado, cumprimenta as pessoas e, a pleno pulmões, volta a oferecer seus produtos. Com entusiamo, revela que aceita pix. Na sua cabeça, ele é um empresário, seu próprio patrão, faz seus próprios horários. Pensa que não é subordinado a ninguém, embora seja refém do acaso. Da sorte. Do imprevisível.

Plantaram em seu subconsciente que ele é um empreendedor. Não é. Ele à apenas um sobrevivente. Alguém que com esforço tenta conseguir o sustento. Não arrisco quando digo que ele pensar estar empreendendo. Ele veste uma camiseta com os tais dizeres. E segue firme aceitando uma condição de nada achando que é tudo. Mas não é empreendedorismo. É apenas bico. É informalidade, é subemprego, é quase nada. É a precarização da já precarizada condição de subsistência.

A situação atesta o quanto a situação atual do país é ruim. Também mostra como a linguagem tem um poder descomunal para iludir. Basta ser usada da forma certa. Basta que crie falsas expectativas. Que mexa com a vaidade. Bem manipulada, ela faz o mais explorado se achar insubstituível.

Espetacularizaram a informalidade. Gourmetizaram o bico. Fizeram o sobrevivente achar que ele é a estrela do espetáculo. Não é. É apenas mais um excluído da distribuição da riqueza. Um desempregado com crachá.

* Professor e jornalista

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