Nos regimes de tirania, as instituições somente se calam diante das atrocidades em duas situações: por medo ou cumplicidade. Tem sido assim ao longo da história da humanidade. Foi assim no triste episódio da sangrenta ditadura militar que assombrou o Brasil por mais de duas décadas.
Em Mossoró, um episódio dantesco ocorrido na última segunda-feira, 20/10, tem levantado questionamento sobre o porque de tantos terem se calado diante do espancamento e sequestro de um jornalista no exercício do seu ofício.
Tão absurda quanto a forma como um secretário de Segurança reagiu a um pedido de informação de um jornalista (que inclusive o acusa de tê-lo espancado e o sequestrado), é o silêncio de tantos quantos deveriam, por obrigação, se manifestar sobre o fato. Não para defender quaisquer das partes, mas para exigir das autoridades apuração imediata e rigorosa.
Além do despreparo dos servidores envolvidos, chama a atenção que as acusações de espancamento e sequestro recaem sobre o secretário de Segurança Pública, de quem se espera ações que garantam a integridade física dos cidadãos.
Não se trata apenas de defender Ronny Holanda que, como cidadão, tem o direito de questionar Walmary ou qualquer outro servidor público. Aqueles que não tiverem condições de ser questionados que peçam para deixar os cargos. O contribuinte mossoroense não paga elevados salários a Walmary e a seus auxiliares para sair espancando jornalistas ou quaisquer outras pessoas que lhes peçam informações.
Trata-se, também, de defender o respeito ao exercício da liberdade de expressão, à prática do jornalismo, garantias constitucionais. De garantir que a Lei de Acesso à Informação tenha efetividade. E, sobretudo, de que a imprensa tenha garantido o seu direito de a ser a voz dos que não tem voz.
Não se trata, também, de fazer juízo de valor e, antecipadamente, condenar quem quer que seja. Mas que se manifestem pela apuração isenta, honesta e imparcial dos fatos. Para tanto, registre-se, o primeiro passo a ser dado deveria ser o afastamento dos acusados dos cargos que ocupam.
Por tudo o que deveria ser feito feito até agora e não o foi, soa cúmplice o silêncio de tantos. Calam por que os acusados são militares? Calam por que a gestão municipal é perseguidora? Calam por que concordam que qualquer que exceda em seu exercício (seja ele qual for) deva ser punido com espancamento e sequestro?
Soa estranho o silêncio de tantos jornalistas que até agora não se manifestaram sobre o caso. De tantos jornais, blogues, portais de notícias e perfis jornalísticos. Vão esperar ser as próximas vítimas para poder reclamar?
Soa estranho o silêncio da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Auxiliar da Justiça e defensora do Estado Democrático de Direito, espera-se da Ordem que exija respeito à liberdade de imprensa.
Soa estranho o silêncio da Câmara Municipal de Mossoró que, como poder cuja função precípua é fiscalizar o Executivo, deveria ter se manifestado e exigido da prefeitura explicações sobre o ocorrido, bem como a instauração, por parte do município, de procedimento investigatório próprio para apurar as condutas dos servidores envolvidos, sem prejuízo de que a polícia também o faça.
Soa estranho o silêncio do Ministério Público, que como fiscal da lei e responsável pelo controle externo da atividade policial, não tenha, publicamente, por meio de seus canais oficiais de comunicação, se manifestado sobre algo tão grave.
É o silêncio de tantos que pode contribuir para que outros casos voltem a acontecer. É difícil acreditar que estejam sendo cúmplices. Mas é apavorante imaginar que estejam com medo.
De cada um desses e de outros tantos que tem a obrigação moral e/ou legal de agir para que não haja mácula ao Estado Democrático de Direito é que a sociedade espera atuação firme, pública e imediata. A Democracia morre um pouco toda vez que silenciam diante de absurdos. Ocorram eles onde ocorrerem.
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