* Márcio Alexandre
Não é de hoje que o ser humano tem verdadeiro fetiche pela violência. Há várias explicações para essa atração pelo horror. O crime, sobretudo o violento, é chamariz à atenção das pessoas. Não é sem razão que as audiências dos programas sensacionalistas (que buscam causar sensação) abundam no rádio, na TV e na Internet.
São “atrações” que exploram a tragédia humana até a última gota de sangue. E embora sem pouca ou quase nenhuma contribuição à melhoria da sociedade, seguem firmes e fortes. E produzindo “astros”. Ou aberrações. Chegaram a nível tão que inverteram a lógica do jornalismo – embora não estou afirmando que tais programas se enquadrem nessa categoria -, a de que quem deve estar em evidência é a notícia e não quem a apresenta.
Os programas sensacionalistas elevaram a maioria dos seus apresentadores a um determinado status, mas é difícil categorizá-los. Em sua grande maioria, não são cultos, não tem preocupação com aprender coisas novas, não pesquisam sobre os assuntos sobre os quais se arvoram no direito de comentar e, tragédia das tragédias, acham que tem lugar de fala em qualquer tema. Mas, na assombrosa maioria dos casos, tão perigoso quanto a falta de identidade é a ausência de conteúdo. Tão perigoso quanto a espetacularização da violência é a “goumertização” da idiotice.
Consagrado como direito inalienável, a liberdade de expressão é um dos maiores ganhos, avanços e legados da humanidade. Sua feição democrática, plural, inatingível, no entanto, não abre permissão para, sob seu manto, se emitir opiniões que ultrapassem o limite do bom senso, do respeito e da legalidade.
Infelizmente, vivemos num tempo em que são muitos que acham que podem desrespeitar, discriminar, agredir, achincalhar, menoscabar. Acreditam que, agradando a alguns poucos, estão imunes a experimentar reações contrárias às ações deletérias que praticam sob o pretexto de estarem exercendo liberdade de expressão.
Ao promover ataques públicos contra categorias, tentam já tirar uma espécie de salvo-conduto, proferindo baboseiras do tipo “podem me esculhambar”, “podem me criticar”, “podem me cancelar”. É não só uma forma de intimidação, mas um escudo em busca de impunidade.
O mais recente caso dessa natureza foi protagonizado por Ciro Robson. Repórter policial em Mossoró por algum tempo, Ciro apresentou programas policiais em emissoras de TV locais e, ao aferir certa notoriedade, chegou às TV de Natal. Essa ascensão vai dando a falsa sensação de que ao estar no ar num veículo de comunicação de massa num mercado maior se conquista o direito de “falar sobre quase tudo” e “agredir quase todos”.
Coincidência ou não, Ciro Robson foi notícia nos últimos dias ao, em seu programa, assacar contra professores. Em voz alta – característica típica de quem não consegue convencer pelo argumento – acusou os docentes de passarem mais de 2 anos em casa ganhando sem trabalhar. Ciro Robson foi infeliz na forma. Mas foi muito pior no conteúdo. Linguagem chula. Palavreado raso. Vocabulário rasteiro. Tivesse ele fazendo essa análise, diria que “vomitou bobagens”.
Todas as profissões, das mais simples às mais complexas na hierarquia da escala social do trabalho são passíveis de críticas. Não há nenhuma atividade laboral intocável. Verificado o erro, natural que se critique. Mas é importante que aquele que está criticando saiba ao menos sobre o que está falando. E se é um profissional da comunicação e não está habilitando a tal, mas precisa apontar o erro, que estude, pesquise, investigue. Ou entreviste quem sabe.
Ciro Robson, pela avaliação do que se viu no vídeo, não fez nada disso. Parece ter “explodido em ódio” a uma categoria para a qual – embora talvez tenha um dia sido atendido por ela – reserva desrespeito e ignorância. Não, amigo Ciro, os professores não passaram dois anos e meio ganhando. Eles passaram dois anos ganhando o que sempre ganham para trabalhar o triplo, o quádruplo e, em alguns casos, até o décuplo.
Nada justifica ter sido tão grosseiro com os professores. Como seria inaceitável que se dirigisse com achaques injustos contra quaisquer outros que exerçam qualquer ofício.
Talvez se conquiste audiência sendo vil, desrespeitoso e ignorante. Mas é uma notoriedade da qual deveria se envergonhar. Não importa a época, muito menos que alguns poucos aplaudam, a imbecilidade nunca dará um bom epitáfio.
* Professor e jornalista
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