* Márcio Alexandre
Um silencioso movimento de dominação pelo uso da religião toma conta do Brasil. E chega, sorrateiramente em quase todos os espaços. Inclusive na educação. De forma ilegal, de maneira desonesta. E socialmente questionável. Um exemplo disso ocorreu na última terça-feira, 20/5, em Mossoró.
A Prefeitura de Mossoró, por meio da Secretaria Municipal da Educação (SME) convidou os estudantes do 5º Ano da rede municipal de ensino para o primeiro Aulão do SAEB, preparação para quem vai se submeter a uma avaliação externa do Ministério da Educação (MEC). Elogiável a iniciativa, apesar da patente falta de valorização dos professores da rede municipal (falamos mais detidamente sobre isso noutro momento).
Pois, bem. Logo após o Teatro Municipal Dix-huit Rosado ficar completamente lotado com os estudantes, deu-se a ocorrência. Uma dessas sutilezas nadas sutis. Dessas “colonizações” em forma de bondade. Dessas dominações travestidas de bem.
Ligou-se o sistema de som e passou-se a tocar um louvor. Finalizada a execução desse primeiro, pôs-se um segundo louvor. E um terceiro.
Atentem bem: um evento educativo, de uma rede pública de ensino, de um país laico, tocando músicas – e apenas elas – de uma determinada definição religiosa. Quando não se contempla todas as crenças é no minimo um desrespeito a quem não professa aquela fé que está sendo privilegiada. E educação não é para reforçar privilégios, mas para ao menos questioná-los.
Como educador, procurei os responsáveis pelo evento e ressaltei o óbvio: que a educação é laica. E sugeri que se tocassem também músicas de outras religiões, inclusive as de matrizes africanas. Acharam melhor não tocar mais música alguma. O que talvez revele que não estivessem preparados para encarar a dimensão plural do pensamento religioso.
Estou na rede municipal de ensino, como professor concursado, desde 2001, e durante esses mais de 23 anos como educador, fui a vários eventos promovidos pelo município em vários lugares, inclusive no teatro municipal. E em nenhuma dessas vezes se tocou música religiosa de uma determinada crença. Mesmo com os prefeitos e prefeitas anteriores professando determinada fé.
Por que agora isso ocorre, não sou eu quem tem que responder. Mas é uma pergunta que precisa ser respondida pois se está abrindo um precedente perigoso. Porque, do contrário, daqui a pouco se será obrigado a fazer essa oração ou aquela reza na escola.
Educação é conhecimento, é diversidade, é pluralidade, é democracia. Priorizar uma determinada religião não é fazer o bem, como a gestão municipal quer fazer crer. É projeto. Com estratégia, ação e finalidade.
É um absurdo que assim ocorra. Não se trata aqui de nenhum movimento contra essa ou aquela religião, mas é uma denúncia contra o uso de uma religião para catequizar para fins políticos. Pior: com propósito de dominação. Sem direito a que o outro escolha.
E ainda há quem acredite que é professor quem faz doutrinação.
* Professor