* Márcio Alexandre

 

Um evento da igreja lotado. Dia de partilha de experiências. Auditório apinhado de gente. Pessoas ávidaa por ouvir boas e edificantes histórias. A cada novo palestrante/testemunhante um novo aprendizado. Uma nova lição. Uma nova reflexão.
A esposa e um vereador da cidade são anunciados. Entram os dois. Ela com microfone à mão inicia sua fala.
Emocionada, tem dificuldade de pronunciar os primeiros dizeres. Voz embargada, olhos marejados. Respira fundo. Toma fôlego. Sabe que precisa dizer o que veio pra revelar.
A plateia anseia. A ansiedade é maior quando se percebe os olhares que ela direciona ao marido. A sensação é de que teme desagradar o consorte. Mas com alguma sorte terá feito o que é necessário.
Inicia falando das provações que passaram com um grave problema de saúde enfrentado na família. Alterna relato, agradecimentos e choros. Caminha para o final quando chega o maior naco de coragem pra dizer o que trará maior ensinamento a todos, pensa ela.

Olha para o cônjuge mais uma vez. Ele baixa a cabeça. Sabe que a revelação poderá trazer algum abalo ao seu capital eleitoral, afinal de contas está em um local que julga ser parte de seu reduto de votos.
“Quando vim para cá, disse pra fulano que não compartilharia nada diferente do que tem sido nossa vida de casal”, afirmou, de olhar fixo nos olhos do marido. Ele tenta, mais uma vez, baixar a cabeça. A vergonha não deixa.
A mulher passa, então, a desfiar um rosário de dificuldades, que inclui afastamento entre eles, distância entre o que pregam e o que praticam, e alguma ingratidão. “A política está nos separando”, resumiu.
O vereador fica visivelmente constrangido. Indisfarçavmente contrariado. Emocionalmente perdido.
De lá para cá, não se tem notícia de como está o casal.
O vereador segue como sempre esteve: do lado do poder, votando contra as minorias, ajudando a massacrar trabalhadores, fingindo que não conhece os pobres. Mas firme na igreja como “bom cristão “. Amém?

* Jornalista

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