A professora Ludmila Carvalho conseguiu uma pequena vitória no processo que pode culminar com sua destituição do cargo de reitora da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (Ufersa).

O juiz da Décima Vara Federal em Mossoró determinou que o Conselho Universitário (Consuni) da Ufersa abra prazo de defesa no processo administrativo Disciplinar que emitiu parecer pela destituição de Ludmila.

O juiz considerou todos os demais atos do procedimento realizado pelo Consuni, decidindo apenas pela abertura de prazo pra Ludmila.

Veja abaixo a decisão:

PROCESSO Nº: 0801619-64.2023.4.05.8401 – MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: LUDIMILLA CARVALHO SERAFIM DE OLIVEIRA
ADVOGADO: Marcos Lanuce Lima Xavier
IMPETRADO: UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO SEMI-ARIDO – UFERSA
AUTORIDADE COATORA: VICE-REITOR DA UFERSA
10ª VARA FEDERAL – RN (JUIZ FEDERAL TITULAR)

DECISÃO

LUDIMILLA CARVALHO SERAFIM DE OLIVEIRA impetrou mandado de segurança em face do VICE-REITOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO SEMI ARIDO – UFERSA objetivando, em sede de liminar, suspender os efeitos da decisão do CONSUNI que deliberou pela destituição da impetrante do cargo de reitora da UFERSA. No mérito, requer a anulação da referida deliberação.
Afirma que, em 04 de Julho de 2023, o CONSUNI (Conselho Superior Universitário) instaurou o Processo Administrativo n.º 23091.010996/2023-12, cujo objeto era a destituição da impetrante do cargo de reitora, em face da cassação de seu diploma de Doutora, proveniente do PAD 23077.086817/2020-21, o qual teve seu curso perante a UFRN.
Aponta que o referido parecer apresenta diversas ilegalidades tais como: 1) o CONSUNI não teria competência para indicar a destituição e Reitora, pelo fato relativo à perda superveniente do título de doutora; 2) cerceamento de defesa, pois não teve a oportunidade de apresentar razões finais; 3) vício na formação da comissão, que deveria ser composta por sete membros, sendo que o professor Hudson Pacheco Pinheiro se afastou por motivo de doença sem ser substituído, e a participação do discente Pedro Victor Cavalcante Santos, que apresentou a denúncia que ensejou o referido processo administrativo; 4) o título de doutor não seria exigência para manutenção no cargo de reitor, mas apenas para figurar na lista tríplice de escolha.
A autoridade coatora prestou informações (id. 13406595). Aponta que: 1) o PARECER nº 00219/2023/GAB/PF-UFERSA/PGF/AGU (NUP 23091.012469/2023-10), emitido pela AGU, recomendou que fosse concedido prazo para reitora se manifestar sobre o parecer da comissão designada pelo CONSUNI, mas ela teria sido notificada apenas para tomar ciência do referido parecer; 2) na 12ª Reunião Extraordinária do CONSUNI, agendada para o dia 31 de julho de 2023, não estavam presentes nem a reitora nem o seu advogado constituído, mas solicitou aos Conselheiros por diversas vezes que considerassem o PARECER nº 00219/2023/GAB/PF-UFERSA/PGF/AGU, pois deveria ser conferido à Reitora o direito prévio de defesa ante o Parecer que estava em deliberação, mas os conselheiros decidiram não acatar o parecer da AGU; 3) o docente Hudson Pacheco Pinheiro se ausentou da comissão sem ser substituído, tanto que não assinou o parecer de conclusão dos trabalhos; 4) há vício na participação do discente Pedro Victor Cavalcante Santos, na comissão de elaboração do Parecer do CONSUNI, pois indicado pelo DCE da UFERSA, que teria interesse direto no resultado da destituição, uma vez que a denúncia que ensejou a anulação do diploma da Reitora foi feita pela então presidente deste DCE.
Decido
A concessão de liminar em mandado de segurança pressupõe, além da caracterização do fumus boni juris, a demonstração do periculum in mora.
No caso, constata-se haver probabilidade do direito a ensejar a concessão da medida perseguida pela impetrante, conforme exposto a seguir.
Como é cediço, cumpre ao Presidente da República nomear o reitor e o vice-reitor das Universidades Federais,escolhidos entre professores dos dois níveis mais elevados da carreira ou que possuam título de doutor, cujos nomes figurem em listas tríplices organizadas pelo respectivo colegiado máximo, eis o teor da Lei 5.540/68, com redação dada pela Lei 9196/95:
Art. 16. A nomeação de Reitores e Vice-Reitores de universidades, e de Diretores e Vice-Diretores de unidades universitárias e de estabelecimentos isolados de ensino superior obedecerá ao seguinte:(Redação dada pela Lei nº 9.192, de 1995)
I – o Reitor e o Vice-Reitor de universidade federal serão nomeados pelo Presidente da República e escolhidos entre professores dos dois níveis mais elevados da carreira ou que possuam título de doutor, cujos nomes figurem em listas tríplices organizadas pelo respectivo colegiado máximo, ou outro colegiado que o englobe, instituído especificamente para este fim, sendo a votação uninominal;(Redação dada pela Lei nº 9.192, de 1995)

Por força do princípio do paralelismo de formas, compete também ao Presidente da República destituir o Reitor e o Vice-Reitor das Universidades Federais, mediante observância do prévio contraditório e da ampla defesa.
Nesse sentido, cabe invocar a Súmula 47 do Supremo Tribunal Federal: “Reitor de universidade não é livremente demissível pelo presidente da república durante o prazo de sua investidura”.
No caso em análise, a impetrante, Ludmilla Carvalho Serafim de Oliveira, teve seu título de doutora anulado pela UFRN, conforme Portaria nº 1074/2023, de 21 do junho de 2023. Em razão disso, o CONSUNI da UFERSA, convocou reunião extraordinária para deliberar sobre a questão e, através da RESOLUÇÃO Nº 58, DE 27 DE JUNHO DE 2023, instituiu comissão para emitir parecer, em até 30 dias, sobre proposta de destituição da Reitora, nos termos do art. 61 do Regimento daquela universidade.
Eis o teor do art. 61 do Regimento interno da UFERSA:
Art. 61. A proposta de destituição do(a) Reitor(a) ou do(a) Vice-Reitor(a) será objeto de deliberação do Consuni, em reunião extraordinária convocada especialmente para este fim, por iniciativa de no mínimo 2/3 (dois terços) dos seus membros. As seguintes orientações devem ser seguidas:
I – na reunião extraordinária, o Consuni deve criar uma comissão composta por cinco docentes doutores, um servidor técnico-administrativo e um discente, para emitir parecer sobre a proposta, em até 30 dias;
II – a comissão tem o poder de convocar qualquer membro da comunidade acadêmica que julgar pertinente para prestar esclarecimentos.
III – O parecer da comissão será apreciado pelo Consuni, em nova reunião extraordinária, convocada por iniciativa de no mínimo 2/3 (dois terços) dos seus membros;
IV – a destituição do(a) Reitor(a) ou do(a) Vice-Reitor(a) somente será aprovada se obtiver, pelo menos, 2/3 (dois terços) dos votos dos membros do Consuni, após apreciação do parecer da Comissão; e
V – caso a destituição seja aprovada, o Consuni encaminha documento à autoridade competente, solicitando a destituição do(a) Reitor(a) ou do(a) Vice-Reitor(a), e indicando o(a) professor(a) doutor(a) mais antigo(a) no quadro da Instituição, para assumir, temporariamente, a Reitoria. O(A) Reitor(a) pro tempore, no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, a contar da data de vacância, organizará a lista tríplice para Reitor(a) e Vice-Reitor(a), para cumprimento de mandato de 4 (quatro) anos.

Foi instaurado, então, o processo administrativo 23091.010996/2023-12, no bojo do qual a referida comissão emitiu parecer o PARECER Nº 371 / 2023 – CDR5 (pgs. 819/842 do Pdf), que teve a seguinte conclusão e recomendações:
“À vista dos documentos carreados aos autos e de tudo o que foi exposto acima, a comissão considerou, por unanimidade, serem procedentes as razões da proposta de destituição apresentada pelas entidades representavas, recomendando ao Conselho Universitário sua aprovação.
(…)
como providências consequentes:
a. a expedição de ofício ao Ministro de Estado da Educação para, no exercício da autotutela administrativa, adoção de providências com vistas à:
1. anulação do Decreto de 21 de agosto de 2020, publicado na Edição:161-A, Seção: 2 – Extra, Página: 1, do Diário Oficial da União, que nomeou, a partir de 30 de agosto de 2020, LUDIMILLA CARVALHO SERAFIM DE OLIVEIRA, Professora da Universidade Federal Rural do Semi-Árido, para exercer o cargo de Reitora da referida Universidade, com mandato de quatro anos, em razão do vício de legalidade supervenientemente identificado, consistente na invalidação de seu diploma de doutorado por decisão irrecorrível expedida pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, nos autos do processo administrativo nº 23077.086817/2020-21; ou subsidiariamente, revogar o referido decreto em razão da perda superveniente das condições para exercício do cargo, em razão da mencionada invalidação de seu diploma de doutorado;
2. nomeação do(a) professor(a) doutor(a) mais antigo(a) no quadro da Instituição como Reitor pro tempore, cometendo-lhe a incumbência de no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, a contar da data de vacância, organizar a lista tríplice para Reitor(a) e Vice-Reitor(a), para cumprimento de mandato de 4 (quatro) anos, na forma do art. 61 do Regimento Interno e do art. 7º, do Decreto nº 1.916, de 23 de maio de 1996.”

O referido parecer foi aprovado pela Resolução nº 67, de 31 de julho de 2023, que teve como único resultado oficiar o MEC (OFÍCIO Nº 1418/2023 – SOC 11.03.01) acerca da perda do título de doutora pela Reitora Ludimilla Carvalho Serafim de Oliveira, requisito para o exercício do cargo.
Como se pode observar, o CONSUNI não deliberou ou determinou a perda do cargo de Reitor pela impetrante, até porque tal prerrogativa compete ao Presidente da República, na forma acima assinalada.
O procedimento em questão resultou apenas em uma proposta de destituição da atual Reitora, em decorrência do cancelamento superveniente do título de doutora que ela possuía.
Tanto que, ao fim e ao cabo, as medidas tomadas pelo CONSUNI se restringiram a comunicar formalmente ao MEC sobre fatos que podem ensejar a destituição do cargo pela impetrante. E não haveria como ser diferente, tendo em vista que a Universidade não tem atribuição para instaurar processo para que ela mesma possa realizar a destituição de Reitor.
Desse modo, o CONSUNI não invadiu de nenhum modo competência que não seria sua, pois sua atuação limitou-se a comunicar à instância competente causa superveniente que impossibilita a permanência da impetrante no cargo de Reitora da UFERSA. E, na condição de órgão colegiado superior de normatização e deliberação coletiva da UFERSA, era lícito ao CONSUNI propor a destituição de cargo apontada, como medida de velar pelos interesses da Universidade e não da pessoa que ocupa o cargo de reitor.
O CONSUNI, portanto, atuou dentro dos limites do regimento interno da UFERSA.
Por sua vez, a abertura do procedimento de proposição de destituição da impetrante do cargo de Reitora da UFERSA também se assentou em motivação legítima.
Com efeito, de acordo com art. 16, I, da Lei 5.540/1968, acima transcrito, somente poderá ser nomeado como o Reitor e o Vice-Reitor de universidade federal os professores dos dois níveis mais elevados da carreira ou que possuam título de doutor. Logo, a titulação de doutor, caso o professor não esteja nos dois níveis elevados da carreira, é exigência não apenas para concorrer ao cargo de Reitor, mas também para nele permanecer em caso de nomeação.
Não procede, assim, a alegação da impetrante de que inexiste previsão legal da exigência do título de doutor para manutenção no cargo de Reitor. As condições para tomar posse devem se verificar também durante o exercício do cargo, sob pena de perder sentido a exigência legal.
Igualmente não procede a alegação de vício de formação da comissão do CONSUNI.
De acordo com a documentação anexada e as informações prestadas, o docente Hudson Pacheco Pinheiro não participou das reuniões realizadas em 18, 21 e 24 de julho de 2023, e não assinou o parecer elaborado pela Comissão, por motivo de saúde. Entretanto, o parecer está assinado pelos demais componentes da comissão, não constituindo a falta dele causa de nulidade, até porque o parecer é submetido ao CONSUNI.
Por sua vez, a participação do discente Pedro Victor Cavalcante Santos na comissão instituída, pelo fato de ele haver sido indicado pelo Diretório Central dos Estudantes – DCE da UFERSA, sendo um de seus membros, não é indicativo suficiente de que ele teria interesse direto no resultado da destituição, de modo a comprometer a sua imparcialidade.
Além disso, consta nas informações prestadas que, “embora ainda não haja ata desta reunião, pode-se ver na gravação da reunião, que o discente Pedro Victor Cavalcante Santos, embora tenha feito parte da comissão que elaborou o Parecer, solicitou que fosse substituído por seu suplente para votação do parecer”, o que afasta a suspeita de parcialidade.
Verifico, no entanto, que o devido processo legal não foi fielmente observado pelo CONSUNI, assistindo razão à impetração neste ponto.
De acordo com o art. 61, IV, do Regimento interno da UFERSA, a “destituição do(a) Reitor(a) ou do(a) Vice-Reitor(a) somente será aprovada se obtiver, pelo menos, 2/3 (dois terços) dos votos dos membros do Consuni, após apreciação do parecer da Comissão”.
Embora o procedimento previsto no referido artigo regimental não possua natureza disciplinar, por não ser voltado a apurar nenhuma falta funcional cometida pelo Reitor, certo é que, uma vez instaurado formalmente, ainda que com finalidade unicamente propositiva, deveria ter sido dado à impetrante o direito de se defender antes de o CONSUNI deliberar sobre a questão.
Nesse sentido, a própria Procuradoria Federal da UFERSA emitiu o PARECER nº 00219/2023/GAB/PF-UFERSA/PGF/AGU, em que reconhece a possibilidade de abertura de prazo para defesa da Reitora ao parecer da Comissão do CONSUNI:
“(e) terceira pergunta -a resposta é positiva. Aqui, não há o que discutir. A despeito dos esforços do parecer apresentado pela Comissão, precisamente no sentido de que o artigo 61 do Regimento da UFERSA não possui natureza disciplinar, inclusive, pontuando que não haveria competência do CONSUNI para instaurá-lo, a problemática encerra, de todo modo, uma proposição de penalidade administrativa, cujo processo decisório, a toda evidência, não é do CONSUNI, mas por certo, inicia-se a partir de sua atuação processual administrativa. O que se discute – e todos do CONSUNI sabem disso – é que a inexistência de infração funcional inviabiliza o procedimento adotado pelo Conselho, tal como destacado pela PF/UFERSA em Reunião Extraordinária, porquanto a destituição de cargo em comissão, tal como previsto no artigo 61 do Regimento da UFERSA, consagra atuação excepcional do CONSUNI, tendo em vista a atuação da Reitora no exercício do cargo ocupado, mas tal fato não ocorre nos autos, poisa problemática decorre de fato sem qualquer atuação da servidora como Reitora da UFERSA, ainda que possa gerar efeito na universidade. De qualquer sorte, a existência ou não de natureza disciplinar é irrelevante para o reconhecimento do direito de manifestação da Reitora durante todo o procedimento adotado pelo CONSUNI, inclusive, após a elaboração do parecer, tendo em vista o disposto no artigo 5º, inciso LV, da CRFB, e nos artigos 2º, § único, incisos I e X, e 44 da Lei nº 9.784/1999[…].
(f) diante dessa transcrição acima, pouco ou nada vale a inexistência de previsão de manifestação da Reitora, após o exaurimento do parecer, no artigo 61 do Regimento da UFERSA, que não pode superar normas de envergadura constitucional ou legal.

Como bem destacado no parecer acima mencionado, embora o art. 61 do Regimento da UFERSA não preveja prazo para manifestação do Reitor sobre o parecer ofertado pela comissão, certo é que tal normativo não pode superar normas de ordem constitucional ou legal.
Desse modo, diante da lacuna da norma regimental, e considerando que a proposição de destituição formulada poderá resultar na efetiva perda do cargo de Reitor pela impetrante – muito embora o MEC não seja vinculado a proposição encaminhada -, por certo que deveria ter sido concedido a ela prazo para manifestação, na forma do art. 44 da Lei 9.784/1999.
Não obstante o parecer acima, a impetrante e seu defensor foram notificados apenas para tomar ciência do parecer da comissão do CONSUNI, não lhes sendo dada oportunidade para fazer defesa escrita ou apresentar alegações finais ao processo, antes da reunião convocada para o dia 31.07.2023, para deliberação sobre o referido parecer.
Diante de tais considerações e por ser evidente a urgência do pleito formulado, deve ser deferida a medida liminar requerida.
Conclusão
Ante o exposto, defiro o pedido de medida liminar, para suspender os efeitos da Resolução nº 67, de 31 de julho de 2023, por meio do qual o CONSUNI aprovou o Parecer nº 371/2023 – CDR58, que propõe a destituição da Reitora e expedição de ofício ao Ministro da Educação.
A presente decisão não impede que a UFERSA, querendo, retome de logo o procedimento instaurado contra a impetrante, concedendo-lhe prazo, na forma do art. 44 da Lei 9.784/1999, para se manifestar sobre Parecer nº 371/2023, antes de submetê-lo à deliberação do CONSUNI.
Intime-se o MPF para apresentar parecer, no prazo de 10 dias.
Após, autos conclusos para sentença.
Intimem-se.
Expedientes, com urgência.

 

 

 

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