* Márcio Alexandre


Tenho uma relação forte com os livros. Tanto com o conteúdo quanto com o continente. O que é e o que tem. Lembro com muito afeto do primeiro que li de uma sentada só: A caminho do Oeste. Aliás, quando descobri que a biblioteca da escola permitia que levássemos eles para casa, levava um por dia.
Comecei com os clássicos infantis. Dos Irmãos Grimm, do Hans Andersen. Depois, “devorei” todos os de Monteiro Lobato que a escola dispunha. Um dos que mais me deixaram em sobressaltos, nas minhas leituras de infância, foi “Vavá, entre o medo e a coragem”, do Jair Vitória.

Sempre que um texto do livro de Língua Portuguesa me chamava a atenção, corria para encontrar a obra completa. Vivia de correr nessas buscas.

Vejo o livro não apenas como uma coisa. É um tesouro. Dos grandes. Dos mais valiosos. Como uma família.
Adoro emprestá-los, mas odeio perdê-los. A relação é de afeto mesmo. Quando algum deles desaparece, sinto antes mesmo de consultar em minha estante. Vou lá apenas para confirmar minha suspeita e aumentar minha angústia.

Cadê a Cecilia? Onde foi parar o Dostoéivski? Com quem está a Martha? Será que devolveram o Hemingway? Emprestei o Mia? Os bichos fugiram com o Orwel? Sequestraram o Elmore? Em que Cortiço se meteu o Álvares? Em que se transformou o Kafka? Quebraram o Machado? Será que o retorno do Harari é breve?

No curso de Pedagogia, um dos primeiros livros que comprei foi “História da Riqueza do Homem”, do Leo Huberman. Emprestei-o. Esqueci depois a quem. Também esqueceram de devolver. Comprei um novo exemplar da obra. Novo empréstimo e novos esquecimentos, e nova perda. Comprei-o pela terceira vez. Está ali, a me espreitar.

Enquanto tracejo essas mal-traçadas, sinto uma nova falta. O Carpinejar não está em seu lugar de costume. Li e reli-o. Há escritas que lhe convidam para uma relida em certas ocasiões. Hoje, gostaria de voltar a conversar com o Carpi. Não o encontrei. Esqueci se o emprestei. Lembro apenas da falta que está fazendo. Como muitos outros que permiti idas. Com afeto e peito apertado. Não retornaram. Me restará novas visitas a livrarias e sebos. Presenciais e virtuais. Porque eles seguem fazendo falta. O papo precisa ser renovado. Principalmente porque foram sem se despedir.

* Professor e jornalista

 

2 thoughts on “A falta que eles fazem

  1. Sem comentários! Coisa de qum lê, sabe de có os nomes dos autores,títulos, quem levou,se os trouxe,se esqueceu…enfim vale a pena escrever para ser lido por tão atencioso e carinhoso leitor.

  2. Ótimo texto! Inspirador!!! Próprio de quem
    lê muito e por isso mesmo, tem competência para dar asas à imaginação e articular suas ideias e reflexões de forma tão coerente e tão coesa. Tem o meu aplauso e a minha simpatia, especialmente pelo seu “caso de amor” com tantos cultivadores da “arte da palavra.” Um dia li:” Ler é um ato que nos liberta e nos dá asas para alcançar voos mais altos.”
    É verdade!!! Sem dúvida, ” a leitura é o caminho.”

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