Caro amigo e colega jornalista Cézar Alves,
Conheço-o há pelo menos 20 anos. São pelo menos duas décadas em que testemunho sua trajetória e nela aplaudo suas conquistas e me regozijo com suas vitórias: pessoais e profissionais.
Dirijo-me a você, no entanto, não como colega de profissão. Falo como professor que sou para o jornalista que és. E assim o faço porque motivado por algo que fizesse como profissional da comunicação.
Pelo conhecimento que tenho de ti, fiquei estupefato com uma postagem vossa no Instagram. Por conhecê-lo, fiquei em estado de choque ao escutá-lo dizer que nós, docentes, estamos quase cometendo crime ao pleitear o respeito aos nossos direitos através da última ferramenta de luta que nos restou na situação atual: a greve.
Você chamou-nos de quase criminosos porque paralisamos nossas atividades letivas em protesto contra o descaso, o desrespeito e a sanha autoritária do prefeito Allyson Bezerra que você, ao nos atacar, parece defender.
Das muitas atividades que com competência o vi exercer, estão aquelas executadas como membro do Conselho de Educação da Subseccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Mossoró. Embora advogado não o seja nem tenha a obrigação de conhecer de legislação para integrar aquele insigne colegiado, faltou-lhe diligência sobre atribuir suposto cometimento de crime a nós ao exercermos o legítimo direito de greve, ferramenta constitucional (artigo 9º da Carga Magna) da qual os trabalhadores podem fazer uso quando as negociações trabalhistas não avançarem.
E no caso em específico, não avançaram, e espero que como diligente jornalista que és, saibas, simplesmente porque durante 55 dias o prefeito Allyson silenciou, covarde e cinicamente, sobre o ofício que em 20 de dezembro o nosso bravo Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Mossoró (Sindiserpum) protocolou no gabinete da prefeitura.
Espero que tenhas cometido o desatino de achacar contra uma categoria tão importante para o país, e da qual orgulhosamente faço parte, pelo desconhecimento.
Talvez não saibas em que condições a maioria de nós trabalha. Com salas superlotadas com até 40 alunos quando portarias do próprio município estabelecem limite de 25.
Talvez não saibas que no mais das vezes, para que muitas das atividades não sejam interrompidas ou malogradas por falta de suprimentos escolares porque muitos de nós arca do próprio bolso com materiais que nunca chegam a uma parcela considerável das escolas.
Talvez não saibas o quanto alguns de nós se arriscam em estradas de barro em locais ermos para garantir que crianças da zona rural tenha aula. E de excelente qualidade. Sugiro uma ida a algumas localidades, para as quais “Deus agora se alembrou de mandar chuva pr’esse sertão sofredor, sertão das muié séria e dos homes trabaiador”. Acrescento: e de professor lutador.
Talvez não saibas há quanto tempo o valor do auxílio-deslocamento está defasado.
Talvez não saibas que “o maior reajuste do piso da história de Mossoró” foi concedido com muita má vontade e pouca efetividade. Sim, amigo, são suaves 7 parcelas em um espaço de tempo a perder de vista. E se ainda não sabes, lhe informo: o pagamento de cada parcela é calculado sobre o valor recebido por nós quando da concessão “do maior reajuste da história” e não sobre o valor do vencimento mais recente.
Talvez tenhas feito uso da expressão “quase crime” num malabarismo vocabular a fazer inveja a Rolando Lero sob receio de sofrer os efeitos jurídicos que uma acusação infundada pode gerar.
A meu ver, não cometeu, para usar suas próprias palavras, nenhum “quase crime”. Incorreu, no entanto, em ato comissivo da decepção. Confesso, amigo, foi triste ver alguém que é (era) tão bem visto pelo povo praticar um desserviço tão grande aos mossoroenses.
Foi enojante ser achacado por alguém que poderia acrescentar à biografia a grandeza de ter proposto um debate sério para a resolução de um problema tão urgente.
Foi nauseante vê-lo em tão constrangedora posição, indigna e incompatível com a trajetória que construístes.
Não quero causar. Não quero lacrar. Não quero curtidas em rede social. Quero curtir o que é meu por direito. E ninguém, nem você, tem o direito de impedir que eu – e meus estimados e valorosos colegas docentes – lutemos por isso.
Lutar não é crime. Titilar também não. Com aquela se ganha pelo menos em dignidade. Com esta, só se sabe o ganho quem se submete a tal.
Cordialmente,
Márcio Alexandre
Professor


