* Márcio Alexandre
A secretária da Educação de Mossoró, professora Hubeônia Alencar, disse, hoje, pela manhã, numa atividade de formação para professores da rede municipal de ensino, que “independente do que aconteceu, nós estamos juntos”.
Foi a primeira tentativa de Hubeônia para trazer para perto de si quem ela, até pouco tempo, não queria ver nem de longe. A secretária atacou, humilhou, espezinhou, menoscabou. Hubeônia sabe o estrago que causou e isso tem causado uma repulsa à sua pessoa por parte de muitos dos profissionais da educação por ela atingidos.
Hubeônia sabe o que fez no verão passado e sabe mais ainda o que precisará fazer nos invernos futuros para continuar onde tanto gostar de ficar.
Lamento dizer, senhora secretária, mas não estamos juntos. Não estamos no mesmo barco. Talvez no mesmo mar. No seu navio há todo o conforto que o poder é capaz de produzir. Na nossa canoa há até buracos. Vejamos:
Os ar-condicionados prometidos pela gestão que a senhora defende mais que a si própria não chegaram a todos. Talvez tenha chegado a poucos. Quem sabe a quase ninguém.
Me acostumei, secretária, nesses pouco mais de 21 anos de sala de aula, a trabalhar no calor e no aperto, mas sem expectativa da melhoria prometida e nunca cumprida. Dessas promessas vãs que as redes comportam sem reclamar e muita gente reproduz sem pudor.
Mas, é importante ressaltar, que é quase desumano para crianças ter quer aprender em condições tão adversas, em salas superlotadas e com ventiladores fazendo muito barulho e pouco vento. E com os alunos perguntando: cadê os ar-condicionados que a prefeitura mandou?
Veja, secretária, não há malabarismo linguístico que eu ou qualquer colega docente faça que seja capaz de afastar da mente das crianças a realidade óbvia: prometeram e não cumpriram. Anunciaram e não mandaram. Mandaram e não instalaram. Para esses meninos e meninas, não há eufemismo. Para eles a constatação é: mentiram pra gente.
Estabelecido o primeiro ponto que confirma que não estamos juntos. Nós professores, não mentimos para pessoas. Nem enganamos crianças.
Poderemos também, secretária, voltar a um passado recentíssimo e lembrar o quanto em suas entrevistas nos atacou. Tem coisas que não dá para esquecer. Como a senhora nos agrediu!!! Algumas vezes diretamente. Noutras, com subterfúgios. Muitas, subliminarmente. Por vezes, sub-repticiamente.
Podemos até estar no mesmo campo, jamais do mesmo lado. Jogamos às claras. Honestamente.
Some tudo isso ao que todo que a gestão municipal fez para nos negar o que é nosso, de fatos e de direitos. E ainda tentar nos fazer de vilão. Nem solidariedade de classe fez, professora, a senhora dizer uma vírgula a nosso favor.
Não vai aqui nenhuma vindita. Vai o contraponto. O contraditório. O outro lado da história. Tudo o que não tivemos direito. E por quê? Porque a gestão da qual és parte pôs tudo contra a gente e até gente ficou contra nós.
Veja, secretária: por obra e graça (não gratuitamente, não confundamos) de tudo o que a gestão fez (eu e a senhora sabemos o que foi feito) vi pela primeira vez em mais de duas décadas de docência, nós professores sendo “esculhambados”. É bem verdade que pelas redes sociais e nesse campo é difícil separar quem é gente robotizada e quem é robô “gentrificado”.
Veja que negócio torpe, professora Hubeônia: nós que sempre fomos vistos como importantes (como realmente somos) e imprescindíveis (como verdadeiramente somos) sendo chamados de “vagabundos” porque espalhou-se uma narrativa de que ganhamos mais do que verdadeiramente ganhamos. Ou que ganhamos mais do que a lei permite. Ou que, ganhemos o que ganhemos, não fazemos jus ao que recebemos.
Olhe só, Hubeônia, nós professores passamos a manhã de hoje trabalhando, nas escolas e/ou na formação (parabéns pela iniciativa).
A maioria dos trabalhadores que trabalham aos sábados tem o período vespertino desse dia, e o domingo, para relaxar seu cansaço e aliviar suas dores. Nós não.
Apenas para pensar na avaliação, Hubeônia, agora a tarde tivemos que avaliar como foi a semana de aulas que concluímos ontem. No meu caso, além da reflexão sobre o que fizemos e o que não foi possível fazer, há ainda a avaliação contínua de 33 alunos. Feita por meio de atividades as mais diversas. E, claro, é preciso ajustar o plano quinzenal com o novo conhecimento e as novas informações da formação de hoje.
Replanejar a próxima semana. Ajustar a rota. A senhora pode até ter coisas parecidas para fazer, mas não iguais, então não estamos juntos. Podemos estar no mesmo caminho, nunca no mesmo navio.
Nós entendemos o que a senhora quis dizer. Que a senhora entenda o que precisa fazer.
Para estarmos do mesmo lado, me perdoe secretária, mas não vai bastar apenas a retórica. É preciso pelo menos um pedido público de desculpas. Pedido esse que deve vir, impreterivelmente, acompanhado daquilo que estão nos sonegando. Sem isso, professora, não ache nem queira fazer crer que estamos juntos.
Não é justo com nós professores. Nem honesto com a História.
P.S.: para a escrita desse texto, sacrifiquei alguns minutos do meu descanso. É preciso sacrifícios para contribuir para que as pessoas saibam qual o lugar de cada um de nós. No tempo, no espaço, na sociedade.
Pela atenção, obrigado!!!
* Professor
Parabéns, mil vezes parabéns! Conseguiu descrever o que os professores não puderam expressar e que ficou engasgado, contribuindo ainda mais para revolta e até adoecimento. Pra essa criatura, uso repelente com uma pitada de veneno.
Belíssimo!parabéns!
Texto excelente, que retrata a realidade, sem tirar, nem por. Arrasou, Marcio Alexandre!
Isso mesmo. Nós estamos juntos dos nossos direitos que eles roubaram. Mas digo uma coisa. Nós perdemos dinheiro e eles a dignidade.
Tamo junto é gíria de facção, de malandro! Não estamos juntos!
Caminhamos Juntos
Trabalhamos Juntos
Lutamos Juntos
Sonhamos Juntos
Juntos nos sentimos humilhados, perseguidos, desvalorizados!
Mas, JUNTOS somos FORTES, isso faz a Diferença que ninguém lembrou qdo nos negou o Direito sagrado por Lei, negou a defesa, a fala, a vez!
De fato Hubeônia, como diz o autor, nós não estamos juntos, mas estamos vendo que a panela que hoje você colabora para cozinhar, amanhã estará cozinhando você.
Parabéns pelo texto , suas palavras diz retrata a realidade do nosso sentimento .Nós, não estamos juntos.Hubeonia !
Parabéns pelas palavras verdadeiras. Você expressou muito bem o desejo de muitos. Não sei como tem coragem de olhar para os professores e dizer ” Estamos juntos ” .
Belíssimo texto. Obrigada pelo tempo que você tirou para descrever como nós professores estamos nos sentido com relação a retirada de nossos direitos. Realmente não estamos juntos secretaria.