O juiz Pedro Cordeiro, da Primeira Vara da Fazenda Pública de Mossoró,  negou pedido feito em ação civil pública para suspender a obra de construção do prédio que vai abrigar o Assaí Atacadista.

O embargo da obra é pleitear por Olívia Siqueira Campos sob alegação de que o alvará expedido pela prefeitura de Mossoró autorizando o empreendimento teria desrespeitado a legislação.

O juiz considerou que, a priori, não está havendo desrespeito à lei, e que para análise do mérito é necessária a produção de provas. O processo,  então, segue em curso.

Veja aqui a decisão

 

 

DECISÃO
Trata-se de Ação Popular com pedido de liminar ajuizada por OLÍVIA OLIVEIRA
SIQUEIRA CAMPOSem face do MUNICÍPIO DE MOSSORÓ, USIBRAS USINA BRASILEIRA DE
OLEOS E CASTANHA LTDA, SOLLIDUS MOSSORO LTDAe de SENDAS DISTRIBUIDORA S/A,
todos devidamente qualificados nos autos, com o escopo de obter provimento jurisdicional que declare a
invalidade ou nulidade do Alvará de Reforma e Ampliação nº 3.521/2022.
Aduz, em síntese apertada, que o Alvará de Reforma e Ampliação expedido pelo
Município de Mossoró/RN em favor da Usibras, destinado à implantação da Loja Assaí com atividade
pretendida Hipercado, “está eivado de nulidade insanável, porquanto em completo desacordo com a
legislação, indo de encontro aos princípios constitucionais da legalidade, publicidade, moralidade e
impessoalidade, dentre outros”.
Anexou documentos e comprovante de inscrição eleitoral.
Dispensado o recolhimento de custas, nos termos do art. 5º, inciso LXXIII, da
Constituição Federal.
Intimados, os demandados apresentaram manifestação prévia acerca do pedido de
tutela provisória de urgência (ID nº 105006514, 105012531 e 105093307).
Sucintamente relatados, decido.
2. RAZÕES DE DECIDIR
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De início esclareço que a Lei nº 4.717/65, ao disciplinar o processamento da Ação
Popular, admite, em seu art. 5º, §4º, a suspensão liminar do ato lesivo ao patrimônio público, o que deverá
observar os mesmos critérios estabelecidos para concessão das Tutelas Provisória de Urgência, previstos no
art. 300, do Novo Código de Processo Civil, ou seja, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco
ao resultado útil do processo, nos termos do art. 22, da Lei nº 4.717/65.
Como se sabe, a Ação Popular é o instrumento adequado à nulidade de ato lesivo ao
patrimônio público, ou de entidade de que o Estado participe, ao meio ambiente, ao patrimônio histórico,
cultural e à moralidade administrativa, sendo certo que esta última pode ser defendida, inclusive,
independentemente da existência de efetivo dano material (STJ, AgRG no REsp 774.935/GO; REsp
52691/MG e REsp 474475/SP).
No caso sub examine, busca a demandante, em sede de tutela de urgência, a imediata
suspensão do Alvará de Reforma e Ampliação nº 3.521/2022, concedido pelo Município de Mossoró em
favor da Usibras, destinado à implantação da Loja Assai com atividade pretendida “hipercado”, de modo a
obstar o prosseguimento da construção.
Para tanto, argumenta que o procedimento de licenciamento, que culminou na
expedição do aludido Alvará, está eivado de nulidade insanável, tendo em vista contrariar as disposições do
Código de Obras, Posturas e Edificações do Município de Mossoró (LCM nº 47/2010), com as alterações
promovidas pela LCM nº 184/2022, in verbis:
“Art. 123. […]
I – Guardar distância mínima de 100m (cem metros) das divisas do terreno onde se
localizará o posto revendedor de combustíveis, de torres de telecomunicações ou de
telefonia, estações elevatórias de abastecimento de água, clubes sociais e/ou
esportivos, casas de espetáculos e diversões, abrigos para idosos, centros
comunitários, cemitérios e hospitais;
II – Guardar distância mínima de 100m (cem metros) das divisas do terreno onde se
localizará o posto revendedor de combustíveis, das testadas frontais de
estabelecimentos de ensino de primeiro e segundo graus, de templos religiosos, de
delegacias de polícia e de creches;
[…]
IV – Guardar distância mínima de 100m (cem metros) de raio das divisas do terreno
onde se localizará o posto revendedor de combustíveis de estádios esportivos, dos
quartéis (Exército, Marinha e Aeronáutica, Polícia Militar e Corpo de Bombeiros),
inclusive de suas áreas de treinamentos e segurança, de subestações abaixadoras de
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energia elétrica, de mercadinhos, de supermercados, de atacados de alimentos, de
centrais de abastecimentos e de distribuição de gêneros alimentícios e seus
congêneres (Cobal, Ceasa, Atacarejo, etc.);
V – Guardar distância mínima de 100m (cem metros) de raio de, das divisas do
terreno onde se localizará o posto revendedor de combustíveis, de locais que
abriguem penitenciárias ou cadeias públicas, o terminal rodoviário de Mossoró, de
estabelecimentos de ensino de terceiro grau e de mercados públicos.
§ 1º. Os estabelecimentos e usos citados nos incisos acima deverão também
obedecer às respectivas distâncias para as divisas do terreno onde se localizam os
postos de combustíveis, em sua implantação quando o posto já esteja implantado
na região;
§ 2º. O disposto no inciso IV deste artigo não se aplica às conveniências dos postos de
combustíveis.” (grifos acrescidos)
Infere-se que a legislação é expressa quanto aos limites físicos que os
estabelecimentos devem obedecer para fins de implantação da edificação, especificamente com relação aos
postos de combustível circunvizinhos.
Não obstante, em análise sumária dos autos, observo que o requerimento de
expedição do Alvará ocorreu quando ainda não tinha sido promulgada a LCM nº 184/2022, responsável por
incluir os mercadinhos, supermercados e atacados de alimentos nas referidas limitações, os quais abrangem a
construção objeto da presente demanda.
Como se sabe, a Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso XXXVI, dispõe
expressamente que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”, de
modo a preservar a segurança das relações jurídicas.
Assim sendo, não há que se falar em descumprimento de lei que ainda não estava em
vigor no momento em que o direito já havia incorporado ao patrimônio jurídico do titular, uma vez que se
apresentava de acordo com as normas vigentes à época.
Desse modo, em atenção aos óbices constitucionais da segurança jurídica, eventual
alteração legislativa não tem a capacidade de tornar ilegítimo/ilegal o ato já incorporado, perfeito ou
transitado em julgado. Nesse mesmo sentido:
“DIREITO AMBIENTAL E URBANÍSTICO – ALVARÁ DE CONSTRUÇÃO –
HABITE-SE QUE DEVE SE REPORTAR ÀQUELA ÉPOCA – DIREITO
ADQUIRIDO – RESTRIÇÕES AMBIENTAIS POSTERIORES INAPLICÁVEIS –
DISTÂNCIA DE CURSO D’ÁGUA: APLICAÇÃO DOS TERMOS ORIGINAIS DO
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CÓDIGO FLORESTAL DE 1965 – RECURSO PROVIDO. 1. A licença de
construção marca a avaliação administrativa quanto ao cumprimento dos requisitos
então vigorantes em relação à obra projetada. Iniciada a empreitada, surge direito
adquirido à aplicação daquela lei contemporânea, sem as restrições de normas
subsequentes (sem prejuízo de estender a prerrogativa para o caso de a norma
específica permitir um prazo entre a expedição do alvará e o início efetivo da
edificação). 2. O habite-se é ato administrativo posterior, que avalia a convergência
entre o projetado e o executado, dando foro definitivo de legalidade à acessão. 3. O
prédio litigioso foi precedido de licença de construção. Ainda que o requerimento de
habite-se tenha tardado, a construção foi concluída antes da alteração normativa, não
sendo justo que a apuração quanto à legalidade da conduta seja definida com base nas
novidades legislativas. O fato jurídico a ser apurado é uma junção da circunstância
material (a obra em si) com a legislação aplicável (que é aquele precedente). Não
fosse assim, o surgimento de um regramento mais restritivo no curso da edificação
deveria implicar a imediata demolição. 4. Caso em que o alvará é de 1974 e a obra foi
encerrada em 1975. Na época, o Código Florestal de 1965 admitia a proximidade
maior com cursos d’água. Alterações legislativas (muito) posteriores não podem
prejudicar o particular, mesmo que tenha, como dito, tardado a requerer o habite-se.
5. Recurso provido para, afastado o óbice, determinar que a municipalidade avalie
como de direito o pedido extrajudicial.” (TJ-SC – APL: 03012796120178240016,
Relator: Hélio do Valle Pereira, Data de Julgamento: 15/12/2022, Quinta Câmara de
Direito Público)
“DIREITO PROCESSUAL CIVIL, CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO,
URBANÍSTICO E AMBIENTAL. APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO.
MANDADO DE SEGURANÇA. CONCESSÃO DE ALVARÁ DE CONSTRUÇÃO
E LICENÇA AMBIENTAL DE ACORDO COM AS NORMAS VIGENTES. OBRA
INICIADA DURANTE A VIGÊNCIA DA LEI ANTERIOR. NEGATIVA DE
RENOVAÇÃO DO ALVARÁ. POSTERIOR ALTERAÇÃO LEGISLATIVA.
RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DO TEMPUS REGIT ACTUM.
VEDAÇÃO À OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA SEGURANÇA JURÍDICA E DO
DIREITO ADQUIRIDO. ART. 5º, INCISO XXXVI, DA CF/1988. APLICAÇÃO.
PRECEDENTES DOS TRIBUNAIS PÁTRIOS E DAS CORTES SUPERIORES.
RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. INTEGRAÇÃO DA SENTENÇA EM
REEXAME NECESSÁRIO.” (TJ-BA – APL: 05026839020188050103, Relator:
BALTAZAR MIRANDA SARAIVA, QUINTA CAMARA CÍVEL, Data de
Publicação: 17/03/2020)
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Diante do exposto, não verifico, de plano, violação à legislação municipal conforme
alegado pela parte autora.
Não sendo suficiente, observo que irregularidades físicas alegadas na exordial
demandam necessariamente a produção de provas adicionais e ampla dilação probatória, tendo em vista que
inexiste nos autos elementos mínimos capazes de indicar que a edificação não atendeu todos os requisitos
previstos no Código de Obras e no Plano Diretor do Município.
Ora, a celeuma gravita em torno especialmente dos limites físicos não cumpridos
pelos demandados para a construção do estabelecimento. Destarte, é fundamental para o deslinde da
controvérsia a produção de prova técnica, por profissional especializado, a fim de confirmar as alegações
autorais.
Dito isto, em atenção à presunção de legitimidade e legalidade dos atos
administrativos, diante da fragilidade da fundamentação e dos documentos apresentados, não vejo como
suspender os efeitos do Alvará de Reforma e Ampliação. Perfilhando desse entendimento:
AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO POPULAR – CONTRATO DE
FORNECIMENTO DE ALIMENTAÇÃO – DANO AO ERÁRIO – LICITAÇÃO –
IMPRENSA OFICIAL DO ESTADO DE MINAS GERAIS – LEGALIDADE –
LIMINAR – REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS – NECESSIDADE MAIOR
DILAÇÃO PROBATÓRIA – RECURSO DESPROVIDO
– Observado a autorização legal para fornecimento da refeição subsidiada, a
Autarquia regulamentou a matéria através de portarias, estendendo o benefício aos
servidores terceirizados da MGS.
– Não restou comprovada a existência de ato lesivo ou ilegal ao patrimônio a
justificar a suspensão do referido contrato, necessitando o feito de maior instrução
probatória.
– Não tendo a parte demonstrado os requisitos necessários para a concessão da
liminar, o não deferimento é medida que se impõe. […] (TJMG, AI
10024132502451001 MG, 2ª CC, Rel. Des. Hilda Teixeira da Costa, DJ 11/04/2014)
(grifos acrescidos)
Por fim, importante evidenciar a gravidade do “periculum in mora inverso” em caso
de eventual concessão de tutela de urgência na presente demanda, caracterizado quando o dano resultante do
deferimento da medida for superior ao que se deseja evitar.
No caso em apreço, é de conhecimento público e notório os grandes benefícios para o
desenvolvimento econômico e social do Município que o ato impugnado poderá trazer, dentre os quais se
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destaca a ampliação produtiva da USIBRAS, a oferta de milhares de empregos diretos e indiretos, além da
consequente movimentação da economia local.
A propósito, trazendo a tona o art. 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro, é necessário que o juiz, instado a aplicar a lei, atenda aos fins sociais a que ela se dirige e às
exigências do bem comum. Sendo assim, na atividade judicante, não se mostra cabível desconsiderar os
efeitos práticos da decisão proferida.
Nesse contexto, sem desconsiderar a pertinência do controle exercido pela população
em geral, bem como a necessidade de se adequar à legislação local, verifico que a suspensão da obra
impugnada poderá ensejar prejuízos superiores à manutenção do Alvará de Reforma e Construção, ainda
mais diante da fragilidade das alegações autorais.
Desse modo, em atenção ao interesse público, bem como aos princípios da
proporcionalidade e razoabilidade, afasto, em análise não exauriente, a probabilidade do direito, qual seja, da
ilegalidade do ato administrativo impugnado.
Ausente o primeiro requisito, resta prejudicado o exame dos demais.
2.1. DISPENSA DA REALIZAÇÃO DA AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO
PRÉVIA. DESNECESSIDADE DE EMENDA
O Novo Diploma Processual Civil passou a estabelecer como requisito obrigatório da
petição inicial a opção do autor pela realização ou não de audiência de conciliação ou mediação (art. 319,
VII), sendo certo que houve omissão neste particular por parte do demandante.
Ocorre que, nas demandas fazendárias de jurisdição comum, a realização de audiência
de conciliação possui algumas particularidades que dificultam a sua concretização.
A prática forense tem demonstrado a inocuidade na realização de tais audiências em
face de situações práticas do dia a dia, a exemplo da necessidade de autorização normativa para realização de
acordos pelo poder público.
Noutro aspecto, é importante esclarecer que a não realização de conciliação prévia
nesta fase não prejudica eventual transação entre as partes, sendo certo estas podem conciliar a qualquer
tempo no transcorrer da demanda.
Assim, em que pese o demandante não ter indicado a sua opção pela realização da
aludida audiência, entendo não ser o caso de emenda neste ponto.
3 – CONCLUSÃO
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Por tais considerações, INDEFIROo pedido de tutela provisória de urgência.
Diante da impossibilidade de realização de audiência de conciliação, pelos motivos já
explicitados, uma vez cumprida a tutela provisória de urgência, citem-se os demandado(a)s para, no prazo
legal, querendo, apresentar defesa, sendo observado, quanto ao prazo, as regras contidas nos arts. 335, III, c/c
183 e 231, todos do NCPC.
Alegando o réu fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor,
intime-se este para, no prazo de 15 (quinze) dias, apresentar manifestação, nos termos do art. 350, do NCPC.
Ciência ao Ministério Público Estadual, nos termos do art. 6º, § 4º, da Lei nº
4.717/65.
Intimações e diligências de praxe, via PJe.
Cumpra-se.
Mossoró/RN, 17 de agosto de 2023
Pedro Cordeiro Júnior
Juiz de Direito

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